Governo cede, mas caminhoneiros estão divididos sobre fim dos protestos
Executivo acena com lei que fixa jornada e tabela para frete. Fim da paralisação nas estradas não está garantido

Em Camaquã (RS), caminhões bloqueiam passagem de veículos no Km 390 da BR-116, nesta quarta-feira 25 Foto: Pedro H. Tesch / Brazil Photo Press / Agência O Globo - Terceiro / Agência O Globo
BRASÍLIA E RIO — O governo decidiu ceder à pressão dos caminhoneiros e atender a praticamente todas as reivindicações do movimento que paralisou as principais rodovias do país nos últimos dias, confiante na possibilidade de acordo. A presidente da República vai sancionar sem vetos a lei do caminhoneiro, que fixa jornada de trabalho desses profissionais e permite que veículos vazios não paguem pedágio. O governo também vai conceder carência de 12 meses nos empréstimos Pró-caminhoneiro e do Finame, do BNDES, feitos pelos caminhoneiros para aquisição de veículos. Para tentar resolver o problema dos preços dos fretes - que vêm caindo principalmente por causa da redução dos preços dos grãos no mercado internacional -, será instalada uma mesa de negociações entre caminhoneiros e empresários, com participação do governo. O objetivo é fixar uma tabela referencial de fretes. Não está claro, porém, se o esforço do governo surtirá efeitos.
O ministro dos Transportes, Antonio Carlos Rodrigues, informou no fim da noite desta quarta-feira que os representantes dos caminhoneiros aceitaram o acordo proposto pelo governo para encerrar os protestos que bloqueiam rodovias no país.
— Fechou o acordo exatamente como o ministro Rossetto (da Secretaria Geral da Presidência da República) apresentou. Eles aceitaram. Já assinamos — afirmou o ministro. — Só vai ser cumprido o que nós combinamos na hora em que forem liberadas as estradas.
Mesmo com a assinatura do acordo, o presidente da Confederação Nacional dos Transporradores Autônomos (CNTA), Dilmar Bueno, não soube garantir se os protestos nas estradas serão encerrados. Ele observou que as entidades vão aconselhar os caminhoneiros a parar a mobilização.
— O movimento foi levantado de forma autônoma, independente. Cabe a eles (os caminhoneiros) a avaliação das conquistas que tivemos aqui na negociação e o esforço do governo em realmente atender ao pleito específico dos caminhoneiros— disse. — Cabe aos caminhoneiros avaliar se compensa continuar com o movimento — completou.
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Questionado sobre como os sindicatos comunicarão os trabalhadores a respeito do acordo, Bueno disse que as lideranças vão repassar a ata da reunião para que elas sejam distribuídas aos caminhoneiros. Mas ele não soube precisar a formar como isso será realizado e disse contar com o apoio da imprensa.
— Acho que a imprensa pode colaborar com o país e colocar isso de forma ampla para que todos os caminhoneiros tomem conhecimento do acordo — afirmou.
Um dos líderes do Comando Nacional de Transportes, Ivar Luiz Schmidt, disse que as entidades que assinaram a ata não representam o movimento e que a paralisação continuará. Ele afirmou representar cerca de 100 pontos de paralisação nas rodovias e garantiu que, sem a redução do preço do diesel em R$ 0,50 até que seja estabelecida a política do frete mínimo, os bloqueios serão mantidos.
— Nós não aceitamos o acordo. Quem está fechando a ata são representantes de sindicatos e de associações que não fazem parte do movimento. Amanhã (nesta quinta-feira), vamos ver se realmente a paralisação acabou - disse Ivar.
A Lei dos Caminhoneiros teve o texto base aprovado em julho do ano passado, mas emendas só foram aprovados no dia último dia 11. Desde então estava pronta para ser sancionada pela presidente Dilma Rousseff, mas havia chance de alguns pontos serem vetados. Os deputados aprovaram uma mudança no texto isentando de pedágio eixos suspensos nos caminhões. A lei fixa a jornada de trabalho dos caminhoneiros em até oito horas por dia, com a possibilidade de duas horas extras diárias.
O governo também está receptivo em relação ao preço mínimo do frete, mas irredutível quanto à redução do preço do diesel ou qualquer subsídio, como declarou a própria Dilma.
ALÍQUOTA ÚNICA SOBRE O FRETE
Uma ideia sugerida nesta quarta-feira ao governo foi a implementação de uma alíquota única em todo o território nacional de ICMS sobre o frete - valor varia em cada uma das 27 unidades da federação - e que o frete de qualquer produto não seja inferior à pauta (valor referencial para a cobrança de ICMS).
Um participante das reuniões contou que o governo está enfrentando dificuldades para negociar com os caminhoneiros porque o movimento é disperso e não há interlocutores que representem efetivamente o conjunto de profissionais que estão há uma semana protestando. Um ministro contou que os governadores dos estados começaram a se mobilizar para tentar achar soluções para destravar o fluxo de produtos pelo país. Com os alimentos parados nas estradas, os estados deixam de arrecadar o ICMS sobre essas mercadorias.
Nesta quarta-feria, um grupo de ministros recebeu representantes da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), da Associação Brasileira de Produtores de Algodão (Abrapa), da Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) e da BR Foods. No encontro, os empresários apresentaram ao governo a situação do transporte de alimentos pelas estradas brasileiras.