sexta-feira, 16 de setembro de 2016



“Foi o que deu pra fazer, professor”

Matheus Pichonelli Matheus Pichonelli15 de setembro de 2016
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Há alguns dias circulava nas notas de bastidores que vinha por aí um tiro fatal no ex-presidente Lula. O tiro partiria do ex-presidente da OAS Léo Pinheiro, personagem ecumênico e desde o princípio onipresente da Lava Jato.

Segundo foi divulgado, as obras no tríplex do Guarujá e no sítio em Atibaia, frequentados pela família do petista e bancados pela empreiteira, eram ficha perto do que o empreiteiro contaria em seu acordo de delação. Além de Lula, Dilma Rousseff, Aécio Neves e José Serra seriam alguns dos nomes implicados.

Nunca se soube se a bala era de festim ou de calibre 12. Em agosto, a delação foi suspensa pela Procuradoria Geral da República após o vazamento de informações para a imprensa, que relatou à época uma proximidade suspeita entre Léo Pinheiro e o ministro do STF José Antonio Dias Toffoli.

Desde então o noticiário esfriou.

No início da semana, o empresário voltou à cena. Ele relatou ao juiz Sergio Moro ter participado de reuniões com políticos para blindar o governo Dilma e as empreiteiras na CPI da Petrobras em 2014. Listou, entre os participantes do encontro, o ex-ministro Ricardo Berzoini.

A notícia deixou meio mundo em alerta em Brasília, mas dormitou em seguida. Dias depois, começaram a surgir as primeiras notícias de que os procuradores da República em Curitiba corriam para fechar ao menos uma denúncia contra Lula.

Ela veio cheia de alarde, hipérboles e adjetivos. Mas, torcida e retorcida, chegava sem novidade, ao menos em relação ao que já havia sido noticiado até então, sobre as estranhas solicitudes da OAS em imóveis que Lula jura não pertencer à sua família.

O tiro fatal de que falavam as notas de bastidores parecia ricochetear em algum lugar de Brasília. A distância para Curitiba não estava só relacionada a quilômetros, mas também ao tempo.

A suspensão da delação de Léo Pinheiro é um das muitas histórias mal contadas da Lava Jato, e talvez sinalizasse aos jovens procuradores do Paraná uma impossibilidade real de avanço.

Daí, talvez, a pressa em concluir a denúncia com o aquilo que tinham em mãos: uma suspeita clara de troca indevida de favores entre um ex-presidente e uma empreiteira condenada por corrupção. A obra pode colocar material de primeira na cozinha reformada, mas não prova a centralidade do ex-presidente no comando máximo da propinocracia como afirmaram na coletiva.

A bricolagem, exposta no exercício rudimentar de Power Point, transforma a peça apresentada num grande trabalho de faculdade preenchido com adjetivos e recortes de jornal para embrumar e estofar a retórica. Faltou alguém dizer: “Foi o que deu pra entregar, professor”.

Torcendo, retorcendo e torcendo um pouco mais, a denúncia pode ser comparada a um manifesto de estudantes contra o presidencialismo de coalizão (tire as 149 menções ao ex-presidente em caixa alta e é o que sobra dali).

No exercício de dedução, os procuradores definem o petista não só como comandante do esquema já suficientemente destrinchado pela força-tarefa da Lava Jato, mas como o grande beneficiário dela. Segundo o raciocínio, “uma vez que, permitindo que fossem desviados bilhões de reais em propinas, para o PT e para os demais partidos de sua base de apoio, especialmente PP e PMDB, tornou-se politicamente forte o bastante para ver a aprovação da maioria dos projetos de seu interesse perante as Casas Legislativas e propiciar a permanência no poder de seu partido mediante a injeção de propinas em campanhas eleitorais”.

Ligar ponto todo mundo sabe ligar, mas essa não pode (ou não deveria) ser o que os procuradores e os comentaristas de portal, prenhes de convicções igualmente adjetivadas, têm em comum. Com a exceção de quem, a essa altura do campeonato, imagina que a Lava Jato seja uma peça de ficção articulada pela mídia e opositores para apear Dilma e seu partido do poder, não há quem não esteja já repleto de convicção ou expectativa de que os mandos e desmandos na Petrobras pudessem ocorrer sem a ciência de peixes, peixinhos e tubarões.

O que a lógica pergunta é se uma reforma de apartamento, e não Paris, valia mesmo tantas missas. A resposta pode estar na delação que, um mês depois de ser anunciada como tiro fatal, ninguém mais sabe, ninguém mais viu.



Em tempo: Tinha feito um alerta, neste texto, de que a frase “não temos prova, mas convicção” estava fora do contexto, mas ela na verdade era uma invenção. Conforme alertou o jornalista José Antonio Lima, o que houve foi uma junção de duas declarações:

Deltan Dallagnol afirmou que “Provas são pedaços da realidade que formam convicção”.

Roberson Pozzebon afirmou que “não teremos provas cabais de que Lula é efetivo proprietário do apto”. Ele disse isso ao afirmar que a suposta ocultação do imóvel seria parte do crime imputado a Lula.

Esses pedaços de realidade citados por Dallagnol serão, agora, analisados pela Justiça para saber se os favores prestados pela OAS ao ex-presidente materializam a suspeita de que ele foi o grande beneficiário do esquema apurado na Lava Jato. A conferir.